segunda-feira, 26 de novembro de 2007

O admirável mundo da voluptuosidade subversiva

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Este é o nosso tempo. Não podemos cair em tentação de o querer diabolizar ou angelizar, ele, como todos os tempos precedentes, é um tempo de homens. De cada vez que nos debruçamos sobre a aventura humana, na tentativa de perceber o sentido das coisas e as pulsões profundas dos homens, o que encontramos é a firmeza de um esforço insensato: negar que sejam as ideias, os valores, os sonhos, as raivas, os medos, os ódios, o altruísmo ou as angústias que fazem mover a humanidade. O homem do nosso tempo é alguém em vias de descobrir a escassez da existência. Aguarda a perenidade dos seus como condição para a sua própria perenidade. Somos potencialmente colectores. Colhemos tão somente uma existência e nada mais. Pensamos o homem como um elogio ao nada. Esse nada é tudo o que nos resta. É o valioso resto que nos constitui. O olho electrónico vigia ininterruptamente a vida quotidiana. No futuro, assim como no passado os avanços do conhecimento continuarão a despertar sonhos e medos à medida que os mistérios vão sendo desvendados. O artificial ganha toda a sua dimensão, criando uma estrutura onde tudo não é verdade mas acontece mesmo. O quotidiano é cada vez mais um lugar de hedonismo manifesto sem vergonha ou falsa pudicícia, o jogo das aparências. Dupla face das palavras, das pessoas e das coisas. "À imagem do tempo «homogéneo e vazio», o do relógio de ponto da fábrica, o vestuário funcional e o indivíduo que lhe serve de suporte (...) diz e rediz sempiternamente a monotonia da existência” (Maffesoli). Eis o trágico da aparência (aceitação lúcida do efémero). A ambiência afectuosa que caracteriza o "presenteismo" baseia-se na aparência, numa vida que se dá a ver, o voyeurismo da contemporaneidade. A vida é construída por prédios anorécticos, por actividades económicas paranóicas e por um sistema tecnológico totalmente maníaco. Da denúncia do totalitário à clausura do sujeito, a contracultura moderna, signo de decadência ou hipertrofia do real, parece, com efeito, preencher a pós- modernidade. Numa relação de inputs-outputs, os diálogos estendem-se à mobilidade do simbólico,ao espaço ritualizado pelo imaginário social. Nestes tempos de neoobscurantismo, descarregar a agressividade contida, interiorizada, pode apresentar-se como uma espécie de substituto da guerra. A crise social actual é também uma crise de tipo orgástico. A máscara não deixou de exercer um certo fascínio, vendo cada um aquilo que ameaça as democracias que se tornaram orwellianas, o rosto anónimo e múltiplo do cidadão vigiado, espiado e massificado. Perante tal cenário, pode-se por isso, falar de psicodrama planetário, de globalização emocional. Porque a questão essencial aqui é impedir que o mundo se desfaça, para usar as palavras de Camus.

10 comentários:

aqui-há-gato disse...

Muito muito filosófica:)
Nem sei o que dizer...
Muita psicologia também:)
pulsão, altruísmos, existência...


O Gato

Red Light Special disse...

E envoltos em máscaras os homens se deixam levar no roleplay da vida.
Viver de verdade? Isso fica só para alguns...
beijos*

Von disse...

Mas é neste nosso (nosso? de todos? de quem?) tempo, que as madrugadas incandescentes, os silênciose os segredos a desvendar a quem merece oferecer, existem? Que as canções furtivas que se descobrem nos confins e nunca se ouvem em mais lado nenhum e as páginas e palavras que dizem em vez de ordenar, que descobrem em vez de esconder, que libertam em vez de limitar, existem? Que as imagens e os rostos mesmo se fortuitos, mas que por qualquer traço se imagina merecer a oferta de outro tempo, um que seja mesmo nosso, imaginado e equilibrado por nós? Um tempo só será nosso, quando ao espelho nos virmos por dentro e nos provoque um sorriso. Um daqueles que duram.

Von

Anónimo disse...

Não há um tempo de ninguém, apenas interpretações do mesmo, e apenas por nossa falta o percebemos como sendo nosso.
A "escassez da existência" apenas advém da perda de ligação com o todo, sendo este algo mais do que palavras e diagnósticos de uma realidade que não é linear senão aos "nossos" olhos.

Clérigo

black puss in white boots disse...

Será Clérigo?Todos nós temos o "nosso" tempo, seja ele físico, mental, espiritual... As explicações e interpretações que lhe atribuímos, servem apenas para o viver com mais ou menos intensidade e com mais ou menos realismo ou abstracção.
Até porque não somos donos do tempo, somos apenas passageiros, que embarcamos na sua viagem. Umas vezes chegamos antes, outras vezes chegamos depois. Sem dúvida, "uma realidade que não é linear senão aos nossos olhos".
E essa realidade está esticada até o limite do (in)temporal. Porém, um (in)temporal que no impulsiona para a imanência da multiplicidade.

black puss in white boots disse...

São áreas sedutoramente promiscuas entre si,Gato :)
Uma vida filosófica para não-filósofos, para de lá arrancar modos de existência nunca antes pensados, cósmicos e inumanos para além de qualquer fiapo de humanidade.

black puss in white boots disse...

É preciso abrir uma linha cerebral, uma paisagem nova do corpo que nos dê o labirinto.
Blackiss redlight ;)

black puss in white boots disse...

É a cine-sensação do mundo, Von. Rotas fixas do pensamento. Placas imperturbáveis de ideias. Blocos de crenças comentados e incontornáveis. Arquitectura rígida a endurecer as malhas sinápticas.
É a travessia cósmica, pelos elementos e pelas formas de vida, pelos crepúsculos de toda a natureza. O pensamento intempestivo, o extemporâneo que só retorna tornado inumano mas sempre com o mesmo sorriso, genuíno e imutável.

Anónimo disse...

Desse modo não me parece que perante a multiplicidade citada se possa mencionar uma escassez da existência.
Talvez se possa referir uma escassez de interpretações. Interpretações essas que se relacionam com a nossa intenção perante o momento.
Perante a totalidade que o tempo abarca, não há um antes e um depois, apenas uma correspondência ou não para com as nossas expectativas.
Talvez a escassez da existência se aproxime assim mais de um medo de emoções, de frustrações?
E se estas existem, não são elas em si mesmas o resultado da existência, assim sendo, muito pouco escassa?

Clérigo

black puss in white boots disse...

De facto é o medo de emoções e de frustrações que tornam a nossa existência escassa. Colocada nas condições de indecibilidade, o organismo consciente reage com pânico, depressão, ou se reterritorializa na identidade.
Lanço-te um desafio clérigo. Que muralhas revestem os contornos sinuosos do nosso cérebro? Como desafiar aquelas instâncias que expropriam o comum, e que o transcendentalizam? Como criar vácuos de sentido, rupturas significantes?